No outro dia, estive a ver, à
noite e com os cobertores até às orelhas (só com olhinhos de fora, a luzir, e o
nariz, para respirar), um daqueles filmes de terror, cheios de suspense e
coisas que são, claramente, p’lo mal.
Após várias tentativas de não
ver, se me privar daquelas imagens que me deixam com pele de galinha, começaram
a passar as letrinhas do fim, e percebi que a vi tudo apenas por curiosidade.
O tal filme, importa dizer, era
sobre um vírus manhoso, que circulava na internet, e por onde viajavam
fantasmas. Não que esteja interessada em ser crítica cinematográfica, mas esta
experiência fez-me perceber que não há maior vírus do que a curiosidade.
Ser curioso, podem dizer, é uma
qualidade do ser humano. Eu cá digo que não é. É antes algo contagioso. É o que
nos leva a juntar-nos a uma multidão que mira qualquer coisa. Não é a
curiosidade de ver, de saber o que se passa. Antes, repare-se, é o facto de
alguém antes de nós ter sido curioso que nos leva a sê-lo também. Como dizia
eu, alguém nos “pegou” isso.
Para reforçar esta ideia, outro
exemplo do quotidiano. Se alguém encontra dinheiro na rua, num sítio onde
passaram dezenas de pessoas antes, que ignoraram a nota no chão, não lhe vamos
chamar “curioso” ou sequer “atento. Chamamos-lhe como? Pois é. “Sortudo”.
Voltando à minha experiência com
filmes que me dão más noites, não estou em contra-senso – não vi o filme por
querer saber como acaba, por ser curiosa por iniciativa própria. Só que, como
li comentários de algumas pessoas sobre o dito filme, indaguei-me sobre a
veracidade do que escreveu quem não conheço, (transmissão pessoa-pessoa).
Outra coisa engraçada de
bisbilhoteiro, e sobre a qual os filmes de terror nos ensinam muitos, é que é
extremamente perigoso porque nos torna…vá lá, à falta de melhor palavra,
torna-nos estúpidos. Se algo estranho está a acontecer, qual é o sentido de ir
lá ver? Se ouvimos uma moto-serra, devemos correr para o lado oposto, coisa que
raramente se verifica. Portanto, a linha que separa a curiosidade da estupidez
claramente não existe, ou está distorcida.
A curiosidade, ainda, desperta em
nós sentimentos mais estranhos ainda, que neste momento nem encontro uma
palavra para descrever. Algo como, repare-se: achamos legítimo espreitar pela
janela de nossa casa, porque estamos em nossa propriedade; mas ficamos
ofendidos se apanhamos um indivíduo à cuca, pendurado na nossa janela. Ora,
relembro que a rua também é propriedade de todos, por isso, é merecedora de
privacidade, certo? Então por que não podemos ser todos curiosos de igual
forma? Nós fomos curiosos, o outro foi “cusco”, que é o mesmo, mas com
maliciosa conotação.
Dizem que ser curioso nos pode
levar longe, que assim aprendemos mais, que ajuda a nunca estagnar. Quanto a
vós, não sei. A mim ser curiosa já me valeu picadelas, cortes na pele, de fazer
sangrar, e respostas atravessadas.
E se ser curioso fosse assim tão
bom, a minha mãe não me teria ameaçado tantas vezes de que o jantar nessa noite
seriam “línguas de perguntador”.
In Jornal Terra Quente
Coluna Más Línguas, boas conversas