quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Raios! Não há botão delete!

A minha vida é recheada de momentos insólitos, que me fornecem um grande discernimento e uma capacidade pensante do tamanho da estratosfera terrestre.

Fui então alertada, por um amigo particularmente atento e cortês, para o facto de a minha cronologia facebookiana ser povoada por réstias da existência de uma relação amorosa terminada.

Ora, isto é deveras preocupante. Não só sobras do passado em si, mas toda esta temática.

Então, é isto. Um dado de que toda a população que utiliza o Facebook já deve estar ao corrente. Podemos até apagar as pessoas da nossa vida e chutá-las para canto no nosso coração. O drama é (verdade, verdadinha) apagá-las do raio da internet.

É que os nossos amigos não têm culpa que outrora posássemos para fotos juntos. E publicam, identificam e comentam. Passa o amor, e fica o “mono”, de recordação, a aparecer no feed aqui e acolá. Raios!

A nossa vida resume-se a um “Sei o que fizeste no Verão passado” qualquer. E sabem mesmo, porque lá estão as publicações, sempre a saltar como coelhos da toca em época de procriação, e que nem nos ocorria que existissem ainda.

E ali fica, permanentemente. O raio (enfatizar esta parte é importante) das anamnesias, ecos do passado. Toda uma vida social fica devastada e condicionada por tempo indeterminado (ler a ouvir música com carga dramática).

Queria pedir encarecidamente ao senhor Mark Zuckerberg que desse um jeitinho a isto. E não era um jeitinho só para mim, nada disso. Aposto que conseguia fazer uma petição com milhões de assinantes a requerer um botão delete para coisas inapropriadas e sem utilidade no nosso Facebook.

Reflictamos em conjunto sobre o tema (muitas cabeças pensam melhor do que uma, principalmente quando essa uma é minha). Pomos fotos, os amigos põem fotos. Tag daqui, tag ali, e temos fotos que nunca mais acabam (e das quais nem se lembram, confessem). Depois, um belo dia, não as queremos mais. E como tirar tudinho? De uma assentada? Ah, pois é! Onde fica a nossa imagem?

Antes das redes sociais é que era. Pegava-se nas fotografias todas, cartas de amor, bilhetes do cinema, papéis de rebuçados (as coisas que os casais apaixonados chegam a guardar, Deus meu!), colocava-se numa tina metálica, regava-se com álcool etílico (ou bagaço, ou whisky, tudo depende do estado emocional), e pronto. Fósforo no assunto, e era ver labaredas tolas a consumir o que pusemos para trás das costas.

Agora não.

Ele é tirar identificações de fotos, ele é pedir aos amigos em conversas privadas no chat para tirarem determinado post incriminatório, ele é ocultar de todos os lados. Uma trabalheira. Raios! (novamente).

O truque é (surpreendam-se) não colocar online nada de amores, romances ou gostos desvairados e/ou voláteis.

Lembrem-se – um post em falso e louco, um dia, pode vir bater à vossa porta quando menos esperarem. É como levar com um pau na cabeça no meio de um beco escuro. Tingas! Nem vemos de onde vem.

 E enquanto não há o tal botão delete, algumas coisas não valem o trabalho e a preocupação que dão. 




sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Já que estou a pedir...

Estou farta, fartinha, de pessoas que pedem coisas. Sim, leram bem.

É que é toda a gente a pedir algo. Há uns que se fazem de modestos, e dizem “Ai, eu só já pedia saúde, para mim e para os meus”. Ora, “só”? Só? Falem com os senhores que estão internados numa unidade hospitalar na altura do Natal nos Hospitais, e aí verão como é bom ter saúde. E depois, nem se resumem a pedir para si mesmos. Não, é tudo à Lagardèr, para a família toda (e sabe-se lá, por Deus, de que número estamos a falar). Entram juntamente aí os amigos chegados, mais os animais de estimação. Outros pedem o Euromilhões, só que nem jogam – porque bom mesmo era o prémio sair sem gastar um centavo nem mexer um chavelho para isso. Saía e pronto. Já que estamos a pedir…

Mas a saga continua. Na charcutaria de um hipermercado qualquer, há sempre uma pessoa (às vezes eu mesma, confesso) que depois de pedir inclusive o salame de bicho-do-mato, que nem sabíamos que existia, diz, após aquela plaquinha electrónica passar ao número seguinte: “olhe, já agora, eram mais umas graminhas ali daquele (e aponta, que nem sabe o nome, mas quer, se calhar porque viu na hora e pareceu apetitoso. Nunca – repito – nunca vão às compras com fome). Já que estava a pedir…”. Há quem só peça favores, mas nunca os retribua – como aqueles vizinhos que pedem ovos ou açúcar, e, já que estamos, para lhes mudarmos uma lâmpada. Porém, quando precisamos, nunca estão em casa, nem têm os tais ovos, que lhes fazem mal ao colesterol. Ou o amigo que nos pede por favor 10 euros, e que por especial favor nunca lhos cobramos de volta.

Estamos a caminhar a passos largos para o Natal. Começa a cheirar a rabanadas e a músicas de cariz sentimental. Com esta maravilhosa época – que eu adoro – vem o quê, perguntar-se-ão. A derradeira época da pedinchice! É a menina que pede as coisas todas das Monster High (que são a Barbie na versão Halloween) à mãe (aos gritos na loja, como manda a tradição), é o senhor Alberto que pede para que os netinhos não sejam gandulos, a Miss que pede paz mundial, são os lojistas do comércio tradicional a pedir clientes, os jovens licenciados e os professores a pedirem emprego, o Rodolfo a pedir férias logo a seguir à consoada, que ainda aproveita parte das festas. E eu peço para deixarem de pedir.

Fazemos assim: deixamos de pedir para passamos a dar. Eu sou um exemplo vivo disso. A minha mãe repete há 24 anos que só lhe dou trabalho. Vêem? Dou, absolutamente altruísta, alguma coisa. 

Podemos dar sangue, dar à luz, dar ideias, dar currículos, dar amor, dar sorrisos, dar coisas de que não precisamos, dar luta, dar que falar, dar no duro, dar nas vistas, dar… Bom, ficamos por aqui. Perceberam a ideia.

Dar é muito melhor do que pedir. Dar é uma frase afirmativa, pedir é uma frase interrogativa. Dar é assertivo, pedir é dubiedade. Dar é ter garra, pedir é ser arranhado.

Se tiverem que pedir (é que temos MESMO às vezes) certifiquem-se que têm algo para dar em troca. Uma moeda rara, com boa cunhagem, de colecção, para ninguém ficar a perder.

É só isto que vos peço.

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Vamos a isto!

Se há coisa que me irrita – e que me caia já um raio na cabeça se isto não for verdade – são as pessoas apáticas.
Gosto de pessoas que vão à luta, que quando não têm fazem por ter, pessoas que riscaram, com um lápis azul moderno, as palavras “não” e “impossível” do seu dicionário.
Sou um pouco idealista, é verdade. Acredito demasiado nos outros, e pior do que isso, em mim mesma (erro crasso). Ainda assim, é bom saber que me posso acercar de pessoas como eu – grito de felicidade porque não estou sozinha no mundo.
É maravilhoso ter ideias, semeá-las, regá-las, adubá-las e depois, quando é tempo, fazer a sua devida colheita. Ora pensem em todas as coisas que ao longo da vossa vida conseguiram realizar? Não é uma sensação – desculpem o calão – do caraças?
Há pouco tempo cheguei a uma conclusão óbvia, e que no meu caso adveio tardiamente. E é simplesmente isto: pessoas apáticas (que normalmente são negativistas) funcionam como âncoras de um cruzeiro de luxo.
O convívio excessivo com estas pessoas vai tornar-nos como elas. Então, mesmo tendo ganho num sorteio mirabolante, não um colchão Molaflex, mas sim uma viagem inesquecível a bordo desse tal cruzeiro, vamos recusar. Não vamos, que assim ninguém se inquieta! É como se nos tivessem prendido um grilhão de ferro pesadíssimo ao pé. Aos dois pés. Sofremos uma metamorfose, e, lá está – âncoras! O casco desse cruzeiro nunca irá saborear o sal do mar alto porque não tem passageiros para levar consigo. Será como um Costa Concordia, e não com um Allure of the Seas.
Eu cá adoro é embarcar nestas viagens alucinantes, com pouca roupa e muito protector solar, só para prevenir. Alvitro que sejamos não aquele irritante turista mimado, mas sim a hospedeira, o cozinheiro, o capitão e o empregado de mesa que sorri quando é chamado e que sai disparado, alegre por ajudar. Nós somos partes vivas desse cruzeiro. E daí ser de luxo, por ter tamanha tripulação.
Está a ver aquela ideia que tem na gaveta? Aquele projecto para o qual nunca pediu orçamento? A obra de bricolage que tem andado a adiar? O plano de ginásio pendurado no íman do frigorífico que ignora todas as manhãs? Pois bem, hoje é o dia de pegar em tudo e de arregaçar as mangas.
Vivo de ideias. Muitas vezes, nunca passam disso. São só ideias. Contudo para mim é como um combustível feito através de uma energia renovável. Para além de não ser poluente, nunca se esgota. De onde veio esta, há mais.
Há umas linhas atrás escrevi que grito de felicidade por não estar sozinha, nisto que considero ser uma demanda à escala planetária. E por estes dias, sem caber em mim de contentamento, constatei o quanto fui tansa por um dia ter achado o inverso.
 Por isso, estas palavras são em especial dedicadas a todos os sinais “mais” da minha vida. Àqueles que não usam de condescendência, como se eu estivesse doente com uma febre qualquer que me afecta gravemente o cérebro, deixando-me insana.
Obrigada a todos que me olham nos olhos, sorriem com franqueza e entusiasmo, e dizem prontamente “vamos a isto!”



O que é meu, é meu!

Quero primeiramente, em jeito de chamada de atenção, chocar quem, por engano, ler estas linhas.

Sem mais delongas, venho manifestar todo o meu fervoroso apoio às cenas de ciúmes. E não, não falo dos arrufos fofinhos de casais, que terminam com ambos a emitir sons estranhos, quais gatinhos a ronronar. Não. Não mesmo. Falo daquelas cenas de filme, com bibelôs a cruzar salas furiosamente, com o rímel a lavar a cara, com urros, ora enraivecidos, ora esganados.

Amor que é amor, tem que ser na rédea curta. Isso de ser liberal é para quem não ama. Confiança? Jesus confiou em Judas, e viram onde a coisa acabou. E antes que alguém vos pregue a uma cruz, vejam bem com que linhas se cosem.

Gosto de extremos. Se é para amar, que seja até a um limite inalcançável, onde reine o sentimento de posse. Se é meu, é meu.

Mas antes de correrem a comprar redomas de vidro, ou começaram a urinar nas pernas do objecto da vossa paixão, continuem a ler, por favor.

Se vamos escolher alguém, que seja um alguém especial. Um alguém como não há em lado nenhum. Vamos acreditar que fomos feitos em pares. Sim, cada um encontrará o seu par. Não um complemento, ou peça perfeita do puzzle. Isso não é amor, é conveniência. Uma forma absurda de fechar a porta à vida, e de lhe roubar o chupa-chupa. Uma relação a sério terá romance, intriga, drama e tragédia. Às vezes será uma comédia recheada de humor negro, que nos fará duvidar das nossas escolhas. Haverá dias de verão, de inverno, e os de meia-estação. Nunca será perfeito, e a sua perfeição estará justamente aí.

Haverá pessoas perfeitas? Claro que há. Basta que as vejam com o vosso coração, e não com a razão. Não ter máculas é aborrecido. Sem graça. Sensabor.

E por tudo isto temos ciúmes, porque encontramos uma utopia só nossa. Estamos a viver o nosso sonho, e não vamos deixar que nos o roubem. O amor não confia, tem sempre o sobreolho franzido, à espera de um motivo para gritar “Ah, ah, apanhei-te meu malandro!”.

Por isso gosto das cenas de ciúmes. São como água da chuva após uma longo período de sol – refrescam, limpam a poeira e, literalmente, acabam com a seca dos dias somente assim-assim. Não se inibam. Pelo sim, pelo não, tenham sempre dois ou três bibelôs sempre a mais e à mão de semear (daqueles que nos dão pelo Natal, e dos quais não gostamos). Expressem-se de forma aberta aos vossos parceiros. Mostrem-lhe como eles são importantes, e que não querem que vos sejam arrebatados, sem luta, sem sangue, sem lágrimas.

Depois? Façam as pazes, de forma ardente e com muito vagar. E não se esqueçam de sussurrar, entre um beijo e outro “o que é meu, é meu!”, só para garantir que a pessoa amada sabe todos os termos do contrato que vos une. 

domingo, 27 de outubro de 2013

Com a verdade me enganas

Há notícias estranhas a circular na imprensa. Muito estranhas mesmo. Li então que, na China, uma jovem recém-casada fez sexo com o padrinho do enlace, por, imagine-se, engano. Aparentemente, no regresso de uma ia à casa-de-banho a noiva desorientou-se, e acabou por se enfiar na cama não com o respectivo esposo, mas com o padrinho, que a começou a acariciar, induzindo o acto sexual.

Sou só eu que vejo inúmeras coisas invulgares aqui? E todas elas óbvias. Há aquele ditado maldoso que diz que “ quem gosta de coisas pequenas é mulher de chinês”; e há quem afirme que a famosa frase “os homens tão todos iguais” foi pronunciada originalmente por uma chinesa. Mesmo assim, “alguma” coisa tinha que ser diferente. Seria a primeira vez deles? Pensaria a noiva que as bolhinhas do champanhe (na China também há champanhe nos casamentos?) tinham tido efeitos sobre o seu marido, deixando-o diferente? E em que raio de hotel, pergunto eu, um/a desconhecido/a (note-se que podia ser um homem a enfiar-se cama adentro, e não uma mulher) nos entra na cama, e nós, em vez de gritar e perguntar “alto! Quem está aí? É plo mal?”, não, fazemos sexo com ele/a? Por momentos cruzou-me o pensamento a imagem do padrinho, muito contente, “boa! Serviram o pequeno-almoço mais cedo. E na cama.”.

Isto só me faz pensar o quão ardiloso e conturbado é o acto sexual. Deveria haver um código para regulamentar a coisa. Se há para a estrada, para a publicidade, para tudo enfim, por que não para o sexo? Era muito mais simples. Assim para além das convenções das traições (que restringem, obviamente, o número de parceiros sexuais numa relação à séria), as pessoas antes de iniciar a sua vida sexual teriam matéria para estudar. Teoria da boa, e não só pornografia e revistas (nada contra isso, antes pelo contrário. Ámen).

Isto leva a outra ilação simples. As pessoas deveriam ser sujeitas a um exame, que lhes daria um título, que as habilitaria para ter sexo. Deste modo os the day after, em que pensámos “onde é que eu tinha a cabeça?” deixariam de existir, porque o parceiro estava devidamente autorizado a ter sexo, com selo de qualidade (agora me lembro que tenho carta de condução, e conduzo mal, mesmo assim. Bom, vou reformular e afirmar antes que o número de fracassos sexuais seria muito mais reduzido).

Logicamente teria que haver uma entidade que regulamentasse a actividade. Uma espécie de Inspecção-Geral das Actividades Sexuais, ou Direcção Nacional Do Sexo. Isto é absolutamente brilhante. Pensem comigo, era uma forma de gerar empregos. Teria que haver pessoas formadas na área para ocupar os cargos necessários, e para leccionar a teoria. E, quiçá, a prática (que já o há, mas não é lícito).

E depois, claro, teria que haver regras rígidas e apertadas (escolhi mal os adjectivos talvez). Algo como: se ela estiver a atingir o orgasmo, tem prioridade, e deve-se ceder a passagem. Ou, por exemplo, estabelecer locais onde não possamos estar parados, para não interromper a circulação. E devia ser proibido fazer comparações entre os parceiros que não são passíveis de prova. Era tudo muito mais simples. Mesmo na fase do pick up.Um diálogo descomplicado ajudaria a resolver muita coisa: “Então, tens licença sexual?”. “Sim, fui aprovado a semana passada”. “Ó diabo!” – Ouvir-se-ia em resposta. “Mas já me tinham ensinado umas dicas antes do exame”, poderia retorquir o outro. E, mediante isto, cada um escolheria.

No caso da noiva chinesa, ela ainda tentou pedir uma indemnização, acusando o padrinho de abuso. Não teve sucesso no seu intento, mas lembra-me que era importante estabelecer multas, delimitar infracções e penalizações. Por exemplo, três queixas num ano por má prestação, poderia dar inibição de ter sexo de um mês a um ano. Se fossem seis, a sanção iria de dois meses a dois anos. E mais do que seis… bem… o melhor seria pendurar as botas. E se alguém acusasse alguém de lhe ter proporcionado o pior acto sexual da sua vida, poderia pedir uma indemnização pelo tempo que o fez perder e pelos constrangedores momentos. E mentir ao parceiro? “Querida, hoje apetece-te?”. “Ai, sim, muito”. E depois fica a contar as moscas que passam. Multa nisso!

E poderia continuar este tema, alegremente. Daria pano para mangas. Ficam dicas importantes. Certamente haveria menos margem para erros e pessoas mais felizes. Passaria a ser difícil mentir sobre a performance sexual e acabavam-se as gabarolices (e voltando à minha carta de condução, relembro que chumbei no primeiro exame prático. Bolas… Diz muito sobre mim!).

“Vou dar-te a melhor queca da tua vida.”. “Estás a falar a sério?”. “Claro.”. E saca da licença sexual, onde passou com distinção. “Nunca ninguém teve uma lasca de unha sequer para me apontar. Nem uma multa, nem uma sanção em dez anos que levo disto”. Discursos assim fariam mais sentido do que: “Terás que provar para saber se gostas ou não. Quase de certeza que eu vou gostar”. E depois nenhum dos dois gosta, mas fizeram sexo, é um facto, e rematam com o ditado popular “com a verdade me enganas”. Aposto que foi isto que se passou debaixo dos lençóis chineses. E tudo que não é passível de prova, fica no "ver para crer". Faz sentido. 



terça-feira, 22 de outubro de 2013

À moda antiga

Não sou uma rapariga moderna. Não, nada mesmo.

Não percebo as febres informáticas, as maluquices dos Iphones e principalmente esta modernização das relações.

Mas o que é isto de amores relâmpago? De one night stand? De mudar de namorados a cada quinze dias? Uma pouca-vergonha.

É verdade, em pleno século XXI continuo a apoiar fervorosamente os amores de outrora. Aqueles em que se namorava à janela (embora, desconfio, havia uma grande habilidade em saltar as mesmas, dada a quantidade de filhos prematuros fruto de casamentos à pressa), ou com os pais a vigiar. Em que dançar com alguém já era algo do outro mundo, e ver o tornozelo da senhora uma ousadia.

Beijos? Estão doidos? Beijos só na mão, ou na testa (e até isto sou contra, dada a carga erótica. Deixa o outro a pensar “ai se fosse mais abaixo…”). E os prazeres carnais? Totalmente reservados à noite depois de dizer “sim” ao senhor padre, tendo como testemunhas Deus, os parentes, os amigos e os namoricos antigos (que choravam desunhadamente).

Basicamente, é isto. É este o meu pensamento. É mesmo. Sou uma rapariga das que já não se fazem.

E daí, talvez não seja bem assim. Mas, não vamos banalizar as coisas. Acho que me estou a repetir. Mesmo assim, todos temos o dever de dizer “não” ao vandalismo a que votaram o amor. Imaginem que o amor é um edifício novo, com cheiro de tinta fresca e uma arquitectura lindíssima. Acham bem que se vá lá encher aquilo tudo de grafitis feios, daqueles em que se escreve o nome ou o clube de futebol? (se escreverem Benfica, até que acho bem. Nos outros casos sou contra). E quando escrevem “amo-te” e o nome de alguém? Isto é duplo vandalismo. Vandalizam a parede e o amor, que um sentimento assim não é numa parede que se estampa.

Nada de modernices e de devaneios. O amor é antigo, cheio de pó. E um pó dos bons, que nem os alérgicos espirram. O amor vem de longe. O amor desbrava caminhos. O amor participou no Survivor, e ganhou sempre. O amor joga xadrez e tem um QI mais elevado do que o do Einstein. O amor enche estádios e coliseus. O amor é como a justiça – cego. O amor é o melhor terapeuta do mundo. O amor é viajado, é sabido. O amor escreve livros, realiza filmes e encena peças de teatro. O amor veste bem e assenta bem a toda a gente.


O amor é tudo, é sim senhor. É como um diamante, que nunca passa de moda. Por isso, amar no passado devia ser igual a amar no presente e no futuro. O amor é antigo – deixem-me enfatizar esta ideia, por favor. E como tal, vamos respeitar a sua essência. Não há espaço para modernizar nem actualizar aquilo que só por existir já é perfeito. 


quinta-feira, 17 de outubro de 2013

A desfibrilhação do amor

Dá-me a sensação – e alguém, por favor, me dê um safanão se for mentira – que o amor anda com mau aspecto. Muito pálido e sem força. Definhado, vá lá.
Pelo que oiço e converso com alguns amigos, dizer “amo-te para sempre” está totalmente out. Ninguém diz isso hoje em dia. É passado! Ou se o diz é com desinteresse, como se fosse algo inconsequente. É como dizer “é uma torrada e uma meia-de-leite, se faz favor” no café da esquina, todas as manhãs. E não. Devia ser dito com o sentimento dos discursos do Braveheart, nessa batalha, por vezes sangrenta, que é amar alguém.
Então deduzo, com o peito apertadinho e cheio de aflição, que o amor está meio morto. Já não é sentido como se fosse um terramoto. Antigamente, quando havia amor do bom, quando dois apaixonados se encontravam, o chão tremia, e era medível na escala de Richter. E toda a gente, com firme certeza, podia dizer “olha, mais um casal que está a matar saudades”.
Agora não. O amor vive do “vamos com calma”, “logo se vê”, “ainda é cedo”, e o mais sensacionalista, “um dia isto acaba, e cada um vai para seu lado”, como que se a partir desse dia todos os passos que derem sejam destinados a ser opostos e a levá-los para longe um do outro. Perdoem-me, mas é como caminhar e ter o ex nas nossas costas, a gritar a plenos pulmões, “vai para o raio que te parta!”. Houve até uma artista, Marina Abramovic, que levou isto de acabar um relacionamento tão a sério que percorreu a Grande Muralha da China a pé, com o seu ex-companheiro, Ulay. Ela começou num extremo. Ele noutro. E quando se encontraram, algures pelo meio e depois de percorridos 2500km, despediram-se e cada um seguiu o seu caminho, aposto que a praguejar baixinho “vai para o raio que te parta.”.
Isto tem que ser falso! Então não era o amor capaz de ultrapassar barreiras? Capaz de superar os defeitos? Esquecíamo-nos que ele nunca baixava a tampa da sanita, ele perdoava os nossos sapatos espalhados pela casa e a falta de espaço no armário. Aceitávamos os defeitos, acarinhávamos as virtudes, e tudo isso junto, qual esparguete à bolonhesa, dava o amor, que polvilhávamos com queijo ralado a gosto e que comíamos, a lambuzar-nos, com molho a escorrer pelo queixo.
Agora o amor é comido com faca e garfo, num qualquer restaurante gourmet, com o guardanapo de pano sobre o colo. É tudo pouquinho, para não fazer mal, com um toque de verduras para ser colorido e saudável. É como ir aos CTT e saber que não vamos ultrapassar o peso permitido, nem pagar mais de franquia.
Tretas! Se já não há amor desmesurado, então não quero amar.
Se calhar nós é que nos colocamos numa posição obtusa em relação a ele. Olhamos para o amor com os olhos semicerrados, com ar de ameaça. E depois, com razão, ele nem se alimenta direito e salta as consultas de rotina.
Por isso sugiro que se dê um choque ao amor. Ele está em paragem cardio-respiratória, e precisa de mais do que de um boca-a-boca. E como acho que está com um pé na cova, o melhor mesmo é pegar já no desfibrilhador e dar-lhe um valente esticão, com muitos volts.



 Publicado in Jornal Terra Quente
Coluna quinzenal "Más línguas, boas conversas". 
3ª publicação






terça-feira, 15 de outubro de 2013

Dá-me música

Hoje, que atravesso um período particularmente musical, dei por mim atormentada com uma ideia. Estive a pensar (momento de rara beleza, diga-se) e na minha opinião o saber popular devia adoptar o seguinte ditado: namorados novos, banda sonora nova.

É que me deixa ligeiramente enervada isto de reciclar músicas, principalmente no que a relacionamentos toca. Quase todos temos uma música favorita, que quando passa na rádio, num bar ou nos nossos auscultadores nos deixa, como dizer, em transe. Algo próximo do sagrado. E por isso não considero justo, nada mesmo, que uma nova relação herde músicas usadas.

Imaginem só, para verem como isto é macabro e de uma insensibilidade extrema. Está um casal de namorados, de forma muito tórrida, a trocar beijos molhados e ardentes, e mais coisas que não é correcto descrever com pormenor. Ele abre uma garrafa de vinho e põe em altos berros aquela música da Whitney, que no refrão é assim: “and I, will always love you”. E nisto deixa cair que a ex-namorada lhe gravou um CD super fofo, com corações desenhados a caneta de feltro, onde figurava aquela faixa. Ou ela canta-lhe ao ouvido, com um tom de pimenta na voz, “take my breath away”, e depois vem ele a descobrir que já muito fôlego ela perdeu por causa daquela sonoridade.

Veemente me manifesto contra isso. Com tantas Alanis, Bryans, Bon Jovis, Scorpions e por aí fora, não merecerá a pessoa que partilha connosco um momento ter uma música só dela? Pelo menos dêem-lhe o seu momento Malato. Quando ouvirem a tal canção: “Ah, já fui tão feliz ao som desta música!”.

As letras das músicas, dizem os entendidos, conseguem expressar de forma perfeita aquilo que, por falta de coragem ou das palavras certas, nunca verbalizamos. Li até num sítio qualquer que, quando alguém nos disser “ouve esta música”, devemos é prestar atenção à letra. Mesmo assim, hei-de eu cantarolar, escrever num postal de São Valentim ou no mural do Facebook a “Because you loved me” a todos os homens de quem gostar? Logicamente que, num determinado momento, cada palavrinha daquilo pode (e deve) ter sido verdade. De forma mais lógica ainda há-de haver um outro alguém na nossa vida para quem as mesmas palavrinhas irão fazer o mesmo ou mais sentido. Mas, vá lá, para todos a mesma música? Cliché em demasia. 

Devemos conter-nos sempre antes de trautear, sequer, canções românticas. Vamos antes comprar CD’s,  vamos ao ITunes, ou vamos sacar ilegalmente melodias novas para ouvir e sonhar. E depois escolhemos uma, qual jukebox do amor, para uma ocasião especial a dois. Ou vamos a um concerto, e zás!, beijamos o respectivo ao som de uns acordes que reteremos na memória para sempre. Meus amigos, e assim trilhamos a nossa história musical.

Mais uma vez, todos os meus pensamentos são idílicos. Isto não sucede na vida real. Isto, senhores, é uma utopia. Não se iludam. A não ser que a música seja recente, e tenha sido lançada já depois de estarem juntos, a probabilidade de ter pertencido a outro alguém é enorme. De 0 a 100? Arrisco uns redondos 80% em como estou certa. Atenção que se estivermos a falar de homens o número aumenta. Como bem sabemos, a sua imaginação e paciência nestas lides é, desculpem-me, quase nula.

Está-nos no sangue! Gostamos de certas músicas, e isso é mais imutável do que gostar de alguém. Rezem todas as noites para pertencerem aos outros 20% restantes. Pensem agora em casais que terminaram relações, em que o amor morreu só de um lado. Enquanto um continua a cantar (e a chorar) Jennifer Rush no banho, a pensar no que aconteceu ("porquê, meu Deus?", pergunta, agoniado), o outro está a sintonizar essa mesma música no auto-rádio do seu carro, para tentar a sua sorte após um jantar mais afoito, pronto para demonstrar todo o seu “the power of love”.

Resolvi agora, neste momento, que nunca vou associar nenhuma música da minha banda preferida a nenhum relacionamento. Depois de reflectir pesadamente sobre o tema, cheguei a uma conclusão brilhante: no que nas relações toca, somos musicalmente limitados. Isto é genético. E não quero ir a nenhum concerto dos Muse para chorar baba e ranho porque uma música, que outrora me dava arrepios, me passou a lembrar um badameco qualquer, que por infelicidade, me deu música.

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

E o que Deus uniu…o Homem facilmente separa

Numa análise através dos tempos, desde os afonsinhos, é fácil encontrar histórias de amor eterno. De duas pessoas que se casaram muito novas, virgens (?), sem terem experimentado grandes namoros anteriormente, e cuja relação gerou muitos filhos e durou, tal como prometeram no altar, até que a morte os separou.
Segundo as estatísticas, na década de 60, em Portugal, em cada 100 casais que assinavam os papéis para se tornarem um só, apenas 1,1 (deduzo que alguns se tenham arrependido, ou não tenham formalizado o pedido, daí 1,1) assinavam mais papéis para retirarem tudo que tinham dito e prometido. Na década seguinte, de 70, o número baixou ainda mais, e apenas 0,6 casamentos tinham um fim. Repare-se, pouco mais de meio casamento só! Já no passado ano, 2012, em cada 100 casais de pombinhos a arrulhar, que até iam à Exponoivos, 73,7 chegaram à conclusão que afinal eram gaviões solitários.

Ora, isto é preocupante. Eu, que não namoro nem nunca me casei, fico um pouco assustada. Primeiro, um casamento é caríssimo. Ele é o vestido, o copo-d’água, o fotógrafo, a lua-de-mel… Enfim, como disse, um balúrdio! E pensar que há pessoas que o fazem de ânimo leve. No dia em que dizem oficialmente o “sim” já estão a pensar em espetar com um “não” na cara do suposto amor para a vida toda, mal tenham oportunidade. Só me ocorre aquela música dos The Black Eyed Peas, “Where is the love?”

Gosto de ser realista, quando a vida assim mo permite. E em boa verdade todos sabemos que muitas pessoas, principalmente as mulheres, não se divorciavam por pressões sociais e familiares. Estava institucionalizado que o casamento era para a vida toda, não havia segundas hipóteses! Muitas vezes, com alguns jogos de conveniência. Conheço até um caso verídico de um senhor, que com o nervosismo de pedir a mão do seu amor ao respectivo pai, se enrolou todo e equivocou o futuro sogro. Assim, o dito sogro percebeu que lhe tinha pedido a sua outra filha em casamento. E pensam que houve cá voltas atrás? Nah nah. Casou com a irmã, mesmo amando aquela que veio a ser sua cunhada.

O que é certo é que as pessoas acabavam por ficar juntas, principalmente no mal. Mesmo que houvesse filhos que eram a cara chapada do vizinho do lado, casos extraconjugais, violência doméstica ou simplesmente falta de amor ou de entendimento.

Em Portugal o divórcio é permitido desde 1910, ano da Implantação da República (data sem importância, que já nem feriado é!), mas corria o ano de 1940 quando o Vaticano assinou uma tal de Concordata que deixou de permitir os divórcios a todos que se casassem canonicamente. E só a partir de 1975 voltou a ser possível (talvez daí venham os magros números que referi há pouco). E agora, descobri horrorizada, nessa grande fonte de saber, que é o Google, que é possível divorciar-se num espaço temporal de 4 a 20 minutos, no Divórcio na Hora. Imagine-se que enquanto verifica o seu email e consulta a meteorologia, pode estar, em simultâneo, a divorcia-se.

Tem que haver aqui um truque qualquer, algo que nos está a escapar. Tem que haver um método para saber: a) se estamos a casar com a pessoa certa, e vamos ser felizes para sempre; b) se não vale a pena casar porque nos vamos divorciar. Podia ainda acrescentar uma opção c), que aposto que era assim que se fazia antigamente. Então, cá vai: c) aprender a dar, discretamente, umas “facadinhas” no casamento, só para saber se afinal estamos bem casados, ou aquilo está pior do que peixe podre.

Isto dito assim parece horrível. Mas, pensemos nisto, pode funcionar como pimenta nos relacionamentos. É como ir experimentar sushi e descobrir que aquilo não é para nós. E passamos a valorizar de uma forma suprema uma asinha de frango no churrasco. Ou vice-versa, porque nem toda a gente gosta de frango e nem toda a gente detesta sushi.

No meu caso, vou continuar a acreditar nos amores eternos e avassaladores, daqueles que vêm sem esperar e que só podem acabar num alpendre, rodeados de netos, ao pôr-do-sol. Contudo, folgo em saber que há mais opções! Até porque nunca gostei de gastar rios de dinheiro em maus investimentos.

E já que proibiram que nas cerimónias de casamentos religiosos se pergunte se alguém tem algo contra o acontecimento (o que é uma chatice para os amantes, que perderam o seu momento heróico), fiquem com a firme certeza de que mesmo depois de atirada a água benta e de trocadas as alianças, é possível, rapidinho e sem maçadas separar o que Deus ali uniu, normalmente com comunhão de bens adquiridos.

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

“Quero-te tanto como a comida quer o sal”

Qual selecção natural, desde os primórdios do ser humano, o Homem autodividiu-se em dois segmentos sentimentais – os que os vivem demais, e os que os vivem de menos. E agora que venha o Darwin explicar este acontecimento!
Temos muitas modalidades nesta área: os lamechas, os picuinhas, os melodramáticos, os durões, os desinteressados e, a minha preferida, os pseudo-desinteressados-que-querem-ser-durões, que são aqueles que fingem que nada lhes desperta interesse e que estão totalmente noutra frequência. Porém, na realidade só esperam que alguém os sintonize na M80, quando passa o the best of das baladas românticas.
Podemos culpar a sociedade, que nos tem cada vez mais ensinado a ser egoístas e frívolos. Podemos culpar a crise, que nos deixa deprimidos. Podemos culpar o vizinho do lado, que nos apanhou a namorar no portão de casa e nos fez ficar de castigo durante décadas. Mas não. Porque nem todos somos assim! Por isso não serve de desculpa. Por cada egoísta e frívolo existe alguém apaixonadamente altruísta. Para compensar os deprimidos da crise, temos empreendedores destemidos. E mesmo quando o vizinho lhes espetou o dedo na cara e os ameaçou de forma peremptória - “vou dizer aos teus pais!” -, alguns, com garra e convicção, gritaram “mas é amor, caramba!”.
Sei que é idílico, mas é um pensamento que gostaria de partilhar. Sejamos nós sinceros, capazes de falar do que sentimos e do que queremos, e o mundo será um lugar melhor – de verdade. Quando digo falar, entenda-se na medida certa. E depois transpor as palavras em acções. Acções francas, motivadas, direccionadas.
Um dia deveríamos ser todos capazes de dizer “amo-te”, “isto não me faz feliz”, “essa camisola fica-te horrível”, “despeço-me” e outras que tal que reprimimos por julgarmos que nos expomos demasiado se dissermos, que está fora do politicamente correcto ou que vão achar ridículo.
No inverso, muitos deveriam incorporar um travão e deixar de banalizar o que lhes atormenta a alma. Palavras repetidas vezes indeterminadas fazem com que percam o fôlego e a honestidade originais. Passam a ser ocas.  
É destes contrabalanços que se faz o mundo. Será porventura isso que o faz girar, ainda que de forma desengonçada às vezes. Cabe a cada um de nós mudar o nosso quinhão. Provavelmente está na altura de fazermos uma introspecção, escolher uma categoria e trilhar todo um caminho. O primeiro passo para descobrir os outros é, justamente, descobrirmo-nos a nós mesmos.
Quando era criança, havia um conto que elegia muitas vezes para a hora da sopa. Há poucos anos, com enorme alegria, reencontrei-o num livro de Alexandre Parafita. Nele, uma filha, a mais cândida de três irmãs, quando confrontada com qual a grandeza dos seus sentimentos pelo seu pai, respondeu simplesmente “quero-te tanto como a comida quer o sal.”
Para mim faz todo o sentido.
O amor é directamente proporcional à simplicidade e à naturalidade com que o expressamos.
Assim como tudo na vida. 


Publicado in Jornal Terra Quente

(coluna quinzenal - "Más línguas, boas conversas"

domingo, 29 de setembro de 2013

Mise en avant

Todos nós deveríamos ter um top of mind para tudo. Uma lista assim em jeito de pódio, onde classificássemos as coisas, de forma totalmente metódica, para nos servirem de referência futura.
Por motivos óbvios, que não vou aqui citar (perda de tempo com assuntos de conhecimento geral), 99% das pessoas que leram isto pensaram em situações ligadas às relações interpessoais, passageiras e/ou de longa duração (vulgo curtes/namoros/casamentos).
Ora, isto tem que ter algum significado. Provavelmente que algo de errado se passa com o amor. Ou não?
Pensemos no amor como uma instituição. Como qualquer empresa, o amor precisa de um Director. Isso, mais uma vez cultura geral, todos sabem que é o Cúpido! Depois os restantes papéis empresariais vão sendo distribuídos a nosso bel-prazer. Mas, lá no fundo, podemos encarar-nos como Relações Públicas desta grande casa, pois o papel de manter boas relações entre o amor e os seus usuários é nosso. Porém, com tanta gente a queixar-se por todo o lado e à boca cheia, acho que o livro de reclamações estará lotado, e o plano de gestão de crises foi já activado por certo.
Como todo o bom profissional, a experiência vem trazendo uma determinada idoneidade, que no início da carreira não tínhamos. Descobrimos que há beijos de língua, a seguir que os bebés não vêm de Paris nem no bico da cegonha, e por fim uma panóplia de outros acontecimentos espantosos (não tenho a certeza quanto à ordem), que envolvem as alegrias e os dissabores próprio destas lides.
E aqui entra em cena a lista. Os primeiros passos são às cegas, muito a medo. Como quando somos bebés e começamos a andar. Se caímos uma vez, temos imenso cuidado durante algum tempo, para não ralar os joelhos de novo. E o que fazemos nessa altura? Fazemos uma nota mental, com um tracinho, e registamos “Não voltar a fazer…”, por exemplo. Será uma lista maioritariamente na negativa, a começar por “não” ou “nunca” ou algum palavrão (cada um tempera como quer).
E aposto o dedo mindinho da mão direita (até porque sou esquerdina) em como todas as nossas listas mentais terão um destaque. Um cume supremo. Uma cereja, geralmente podre, em cima de um bolo raquítico e light, sem calorias, nem açúcares, nem coisinha que faça mal.
Esse destaque está para nós, pessoas comuns, como o sinal vermelho está para o código da estrada. É o ponto de parar, de dizer “Nah, nah! Isto agora era o que me faltava. Ui! Na escola onde tu estudas, já eu fui professor/a!”. O problema é que, por vezes incautamente, substituímos o sinal vermelho pelo sinal de STOP – antes de termos a carta de condução, paramos, depois passa a ser um sinal de cedência de passagem, e abrandamos só, mas com vontade de continuar. E conquistamos mais um tópico na nossa lista mental. Ou seja, começamos a ficar imunes e avançamos, determinados, nem que seja para um abismo.
Isto quer dizer, em resenha, que nos esquecemos com facilidade daquilo que nos fez menos bem, na esperança de encontrar algo melhor. O passado fica atrás das costas, e vivemos réveillons constantes, com direito a contagem decrescente, champanhe e festarola. É, voltando atrás, como uma estrada em que algum engraçadinho roubou os sinais de trânsito todos, e simplesmente ignoramos as placas de aviso do nosso destaque mental.
Será mau? Eu acho que não. Antes pelo contrário. É bom ver alguém com um brilho nos olhos a dizer “Ah! Desta é que é! I have a feeling!”. E o nosso mise en avant mental deixa de ser negativo, e passa a ser 100% optimista.
Poderíamos pensar ao contrário, por esta questão com as tripas do avesso, e dizer que esta tal lista mental devia era ser, sempre e somente, positiva. Algo mais “aquilo que devo repetir”. Na minha opinião, tal não é preciso. O que nos faz bem e felizes, repetimos vezes sem conta, sem pensar, sem sofrer, sem algum “sem”. É tudo “com”. E quanto mais “com”, melhor.


quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Fitas e cenas tristes

Raros momentos são, mas existem, aqueles em que penso em mim.
Calma! Não digo isto por ser altruísta extremista, ou ter falta de amor-próprio, ou por ficar enamorada com o meu próprio reflexo (o que acontece com frequência). Nada disso.
É uma daquelas fases em que é como que se estivéssemos sentados na plateia desse grande cinema que é a vida, e víssemos a nossa vida como se ela nos fosse alheia.
Pegando neste pressuposto, analisando cinematograficamente a minha vida, para começar, o argumentista era sem dúvida muito fraco. Pouca acção, personagens absolutamente dantescos e cada fechar de capítulo assemelha-se estranhamente a uma tragédia grega. E a personagem principal – relembro aos mais distraídos que estamos a falar de mim – é totalmente bipolar, azarada e com a mania. O realizador também não está de parabéns. Não escolheu os planos certos, para me favorecerem mais. Até a iluminação deve ser feita com lâmpadas económicas – sabemos que estamos a fazer bem ao ambiente, mas a luz é fraquinha, deus nos livre! Bom, poderia falar do elenco, mas apenas os papéis secundários foram mal entregues, com aqueles actores que nunca decoram as falas e cheiram de forma duvidosa a whisky manhoso.
Se a minha vida fosse mesmo um filme – tirem notas para referências futuras – queria ser uma boa vilã. Ninguém confia em pessoas boazinhas demais. Aliás, a mim assustam-me! Não há ser humano sem lado negro, que sorria a todo o instante e nunca arranje uma desculpa (mesmo querida) para evitar uma situação chata. Mas também não gosto de gente má rês. Isso não, que me dá asco! Por isso o meio-termo parece-me bem – entre a mártir e o implacável sanguinário.
Depois, claro, haveria a perfect love story, como nos filmes. De preferência com um Matt Bomer heterossexual qualquer. E o final seria minimamente feliz. Assim sem grande aparatos, uma coisita eficaz e realista.
No entanto, aconteceu o impensável. E eu sou argumentista, realizadora e actriz (principal, secundária e algumas vezes, figurante) da minha vida. E isso veio a revelar-se uma calamidade.
Assim, não há Bomer para ninguém. É mais como ter uma vida amorosa estilo festa VIP – eu nem sequer fui porque não me convidaram e não tinha dinheiro. O resto mantem-se (nunca disse ter jeito para o guionismo).
Nem tudo é mau. Posso sempre planear um final inesquecível e hollywoodesco.  E até lá vou ensaiando em frente ao espelho a cena principal, com enorme carga dramática, e esperar que um dia alguém grite: “Cortaaaa!”
Mas corta o quê, pá? Agora que isto estava a aquecer…


A experiência

Tal como acontece a todos os jovens estudantes, com o aproximar do final do curso académico, os pensamentos sobre o que me espera no mundo de trabalho começam a assolar-me. Pesquisei já em muito sites, daqueles em que figuram inúmeras ofertas de emprego. E a cada novo anúncio que lia, a sensação de estar a cair de um precipício ia aumentando. A palavra “experiência” aparecia copiosamente em todos os dignos de registo, e, estranhamente, com o número 2 ou 5 à frente. Completando o puzzle ler-se-ia algo semelhante a “experiência mínima de 2 anos de trabalho efectivo”. Certo é que é difícil conseguir experiência quando as oportunidades parecem estar num pedestal. Alguns conseguem-na, outro não, dependendo da arte, do engelho e da persistência com que se encara o assunto. Há alguns dias li uma frase que dizia, mais ou menos, que cada “não” ouvido é mais um passo para se alcançar um “sim”. E realmente, exceptuando as desventuras de milhares, funciona assim. Essa malvada palavra – experiência – não me saiu da cabeça. E num estilo algo freudiano, cheguei ao impensável – ela invadiu os meus sonhos!
 Ali estava eu, num posto dos CTT, com um molho de envelopes, recheados com o meu anoréctico currículo, onde se lia, em letras garrafais, “devolvido por falta de experiência”. De repente, estava numa sala branca, num estilo decorativo semelhante a um consultório de dentista, que identifiquei através de uma plaquinha (sim, os meus sonhos têm legendas), como sendo o departamento de Recursos Humanos de uma qualquer cadeia de hipermercados nacional. Esperei pela minha vez, por entre uma enorme fila, até ser chamada para ir à faca, que é como quem diz, à entrevista de emprego. Enfim, convocaram o meu nome. Avancei decidida. Era a hora. Atrás da porta estava uma senhora – a senhora do departamento dos Recursos Humanos – com um nariz pontiagudo e uns óculos minúsculos e redondos a pairar sobre ele. Apenas proferiu uma pergunta: “A menina tem experiência?”. Empalideci e a boca secou. “Aaaa… bem…sim…”. Podia sentir o sangue cristalizar nas veias. “Costumo utilizar as caixas automáticas sempre que venho às compras”, rematei.
Mas não foi suficiente. Quem ficou com o lugar da Caixa 9 foi a Cátia Vanessa, que trabalhou no supermercado do bairro quando deixou os estudos, e que declarou ainda que tinha nascido para aquilo. Ali estava, uma comprovada experiência! Depois disso, acordei atordoada. Na minha cabeça, flutuava a imagem da Cátia Vanessa a passar uma embalagem de leite e um quilo de maçãs pela caixa registadora, enquanto eu saía pela porta dos fundos, ao som dos “bip, bip, bip” compassados. Não posso negar que com a experiência vem a sabedoria. Os dizeres populares têm sempre razão. Mas, é incontestável que actualmente é necessário ter sabedoria para obter experiência. No final das contas, experiência temos todos. Pode é não ser na área laboral a que desejamos pertencer. Alguns são versados na cozinha, outros na condução. Outros, ainda, são exímios a descortinar a vida dos outros. Ainda assim, para os jovens que procuram emprego (muitas vez, o primeiro) não deveria contar a vontade de aprender, em vez da experiência? Não somos nós, jovens, que vamos ser a fonte de produtividade do país? Muitos apenas esperam uma oportunidade para serem abarcados pelo mundo do trabalho. Para provar que querem ganhar experiência e que estão à altura do desafio. Para já, sem experiência no ramo que quero seguir, procuro explorar as experiências que a vida me dá (com um empurrãozinho, que nada cai do céu!). E, um dia, escreverei um livro com a minha experiência!

O estranho caso das relações

As relações são o que são, chegam onde tem de chegar, e nada mais há a dizer. Contra factos não há argumentos.
Sumariamente, existe muito esta mania de fazer perguntas e de pôr todos os “se’s” possíveis, como que se isso fosse mudar o rumo da nossa vida. Palavras não mudam nada, e pouca gente é frontal ao ponto de dizer o que sente realmente. Por isso, perguntas como “se eu mudasse o meu feitio por ti, ficavas comigo?”, ou “se eu arranjasse um emprego aí por perto, podíamos ser felizes?” não vão trazer nada de novo, a não ser o mal-estar geral e uns quantos ataques de vómito.
Nisto de estar com alguém, amar alguém, estar apaixonado, esbarrar ocasionalmente, não há truques nem dicas. Somos o que somos, o que cada pessoa nos faz ser. Se já mudei por alguém? Sim, já. Se valeu a pena? Nem por um segundo.
Ouvi um casal discutir numa mesa de café. Um jovem casal, em idade e maturidade. Ela atirava-lhe à cara que só ele só liga aos amigos; ele, muito ofendido, defendia-se dizendo que se ela quisesse ele poderia mudar isso, enquanto, entre uma frase e outra, negava copiosamente tudo que saía em jorro da boca dela. Podemos concluir que são o centro do mundo um do outro. Podemos também concluir que ele queria estar com os amigos, e ela queria beijinhos e carinhos a toda a hora, estilo cola UHU. Por isso, podemos aferir que nunca algo assim terá pernas para andar.
Acredito que se possa ter alguém sem a necessidade de o verbalizar, de o demonstrar a toda a hora. É nosso e pronto. Um breve olhar e um sorriso trocados entre os dois será como uma longa conversa num dialecto próprio. Sem cobranças. Sem rotinas inúteis. Apenas duas pessoas que se agradam com a companhia do outro. Que são felizes por se poderem ajudar mutuamente. Tudo isto de uma forma imperceptível ao mundo, mas capaz de abalar o mundo delas.

Todos os dias.  

O consultório do amor

Quem me conhece sabe que odeio hospitais. Hospitais, ou coisas similares. Vá lá, tudo relacionado com a saúde me deixa doente. E além disso é o sangue, as agulhas e até os kits de primeiros socorros. Resumindo, para me arrastar até uma unidade hospitalar, é sinal que estou já a ver o São Pedro entre nuvens, ou um túnel estranhamente iluminado.
Contudo, e porque dizem que a idade nos torna mais maduros, resolvi começar a zelar pelo meu bem-estar físico e psicológico (e daí, talvez a minha mãe tenha algo a ver com este assunto).
Após 8 meses de longa espera, - sim, isso mesmo, SNS – tive direito a 20 minutos de consulta só para mim!
Entre as inspirações e expirações, algumas perguntas básicas e uns formulários para preencher no computador (que estava sempre a encravar), fui percebendo que, afinal, não estava a ter só uma consulta médica de rotina. Melhor do que isso. Tudo aquilo era um pack exclusivo – por apenas uma consulta receba também, totalmente grátis, conselhos amorosos.
Saí um pouco mais esclarecida daquela sessão. Não em termos médicos. Ou, posto nesses termos, saí especialista em cardiologia. Fiquei assim a saber, por quem já viveu mais do que eu, que namorar não é, de todo, forma de conhecer alguém. Devemos conhecer os homens como amigos e dar-lhes uns “apertões” (só para ver como reagem). É como diz o povo: apalpar bem a fruta na mercearia, não vá o diabo tecê-las e ela vir podre.
É que, aprendi nesta pequena palestra sentimental, os homens como namorados ocultam coisas. Se é namorado, já não vai ser ele mesmo. E depois de casados…Ai aí é que são elas! E dá para o torto. Portanto, sejamos amigos. Se houver a tal “chama”, num mês estamos aptas para casar.
Ora, isto até tem a sua lógica. Os nossos amigos não têm que nos agradar, nem pagar a conta, nem reparar que cortamos o cabelo, nem dizer que estamos bonitas com aquele vestido. Isto porque são homens, certo? Homens sem segundas intenções nas mulheres, normalmente, não prestam atenção a tamanhos detalhes. Mas, se houver um amigo-homem que aja de forma diferente, e faça tocar sininhos na nossa cabeça, pode perfeitamente ser um noivo-homem, ou, quiçá, homem-homem.
Outra questão focada pela minha médica-conselheira, muito pertinente, é o amor à primeira vista. Ela acredita que existe.
Já me apaixonei à primeira vista. Só que nunca por homens. Vestidos, sapatos, e outros que tal, são capazes de me arrebatar o coração. Só que muitos, de perto, desiludem. E tenho de fazer o meu luto amoroso, e passar para a montra seguinte.
Com os homens não é o mesmo? Olhamos, e ficamos pelo beicinho. Vemos mais de perto, e os defeitos aparecem. Às vezes são tantos, que parecem brotar como água de uma fonte. Aqui fazemos o tal recolhimento emocional, e passamos à fonte seguinte.
Não cheguei a conclusões irrevogáveis sobre o amor ou os homens. Isso não. Mas pelo menos trouxe papéis com toneladas de análises para fazer. O que, convenhamos, nos dias que correm, é melhor do que um homem-homem ou um amor à primeira vista.


 Publicado in Jornal Terra Quente
(Coluna quinzenal "Más línguas, boas conversas")