terça-feira, 2 de setembro de 2014

Os empatas

Nunca acreditei tanto em que diz, à boca cheia, que uns e outros só andam cá a empatar a malta.

Pessoalmente, achava que todos fazemos falta, para podermos dar um contributo à humanidade, ou simplesmente para contabilizar número e parecermos muitos em caso de uma invasão extraterrestre.

Estou neste momento na pequena fatia que acha que a restante população deveria ir dar uma volta a Marte.

Esperem, senhores da NASA! Escolhamos antes outros colonos para um novo mundo.

Somos um bando de críticos de sofá que faremos sempre melhor, sempre seremos mais espertos, mais dinâmicos, mais
bonitos, mais magros, mais polivalentes.

Só não fazemos mais porque, e passo a citar, “não tenho tempo nem paciência para gastar com pessoas que não valem a
pena.”

E, como não fazemos nada, mas picamos ponto, estamos para a sociedade como os carros das escolas de condução ou os chamados “papa-reformas” para o trânsito – fazemos engarrafamento. Ou como o colesterol para as veias – só entupimos.

E aqui vamos andando, a pisar as ideias dos outros só pelo simples facto de não termos sido nós a tê-las.

Deveria haver uma lei que obrigasse toda a gente a ajudar quem quer pensar out of the box, a quem não tem medo de dizer “eu tive uma ideia”,
porque de facto a teve mesmo, e tem os requisitos para a levar avante.

Isto porque os que devem, marejados com o que os rodeia, não acreditam em si, no seu potencial. Mais! Muitos não têm o potencial, de todo. Pior! Esses são os que acreditam que têm talento para tudo quando na realidade não o têm. Desgraça! São seguidos por um bando de acéfalos que lhes dão voz.

Sou da opinião de que quem não pode fazer, deve deixar fazer. Como nos filmes, quando alguém se está a esvair em sangue e sicrano grita, lá do meio da multidão: “Sou médico!”. E o pessoal o que faz? Abre caminho.

E o senhor passa, faz truques como o MacGyver, e conclui a performance a salva uma vida.

Imaginem que não se abria caminho, e que o médico era impedido de prestar auxílio? Assistíamos, de forma
colectiva e passiva, a uma morte.

É o que acontece na vida real. As vítimas são os sonhos, que clamam por ajuda para serem concretizados. Mas não chega o socorro, porque os doutores não vêm, com as agulhas e os termómetros e os analgésicos e as compressas que a situação demanda.

Porquê? Porque esbarram nos empatas, que ainda se acham no direito de gritar “Ei, não empurrem. Parece que não têm tempo de chegar. Eu também esperei nove meses para nascer. Acalma lá os cavalos.”, e acrescentam um “meu” no fim, que dá um ar de mafioso capaz de
tudo.

São mesmo capazes de tudo. Capazes de ver um sonho morrer, em praça pública, sem mexer uma palha para que aconteça
o contrário.

Não bastando, os empatas são os mesmos que reclamam da inércia, da falta de resultados, de trabalho.

Dizem-no perante os sonhadores, que viram sangrar os seus planos em público. Eles apenas podem encolher os ombros,
e ir sonhar para outra freguesia.

“E os ideais, pá? Onde estão os ideais?”, ouve-se na multidão.

Mas os sonhadores, esses, já não estão.

Foram fazer as malas e reservar um bilhete para Marte, sem esperança que algo mude.


Coluna "Más línguas, boas conversas"
In Jornal Terra Quente

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