terça-feira, 2 de setembro de 2014

São só 5 minutinhos

Há um hábito muito tuga, muito nosso e muito patriótico de pedir 5 minutinhos às pessoas.

Pedem-me 5 minutinhos na rua, quando caminho com pressa desenfreada; roubam-nos 5 minutinhos numa chamada telefónica (desconfio que mesmo nas linhas eróticas) para confirmar informações; 5 minutinhos demoram os nossos amigos a chegar ao local combinado; 5 minutinhos é o tempo que temos que aguardar numa repartição qualquer, para que depois seja a nossa vez; 5 minutinhos é o tempo que nos separa da resolução de todos os nossos maiores e prementes problemas; vamos dormir só mais 5 minutinhos de manhã.

Estes 5 minutinhos (e, reparem no diminutivo, que tem com função fazer parecer que se tratam de meros milésimos de segundo, e que num abrir e fechar de olhos, voilà, tudo pronto! Sem espinha nem espiga.) dizem-nos serr somente uma fracção irrisória da nossa cronologia.

Acontece que 5 minutinhos é muito tempo.

Tive plena consciência disso com duas miúdas de 6 anos, a quem, num acto que puro amor à bandeira das quinas, dei 5 minutos para se deslocarem à casa de banho.

Foi uma canseira ver as pequenas a galgar escadas, qual maratona ou corta-mato, para que não ultrapassem os precisos 5 minutos que lhes disponibilizei. Quando voltaram, ofegantes e orgulhosas por cumprirem o meu dealine, perguntaram-me: “Mas quanto é que são 5 minutos?”. É que elas não sabiam ainda o valor das horas, e os ponteiros a mexer-se no mostrador de um qualquer relógio pouco mais queriam dizer do que um tic-tac qualquer.

Retirada na minha ignorância sobre a infância, estiquei um pulso trémulo para lhes explicar (sou tão querida às vezes eu!). Depois de elucidadas sobre esta questão, encolheram os ombros, de declararam, com a espontaneidade que só uma criança de 6 anos tem: “Oh! Afinal 5 minutos é muito tempo!”.
E é mesmo. Elas têm razão.

Fazemos tantas coisas em 5 minutos. Desfazemos tantas coisas em 5 minutos.

Adiar 5 minutos, ou atrasar 5 minutos, pode fazer a diferença. Entre a atitude e a inércia estão, aposto eu, 5 minutos, de braços esticados, a marcar a distância.

Se podemos adiar 5 minutos, por que não fazer agora neste momento? Se queremos já, porquê esperar mais 5 minutos?

O tempo é precioso para o adiar sucessivamente. Ora perguntem ao Cronos.

Podiam dizer que noutros povos estas expressões temporais também são usadas, que não é nada de nosso, como a saudade. Pois eu acho que é. Aliás, alguns preferem falar em segundos. Mas nós, não. É tudo em grande, e por isso pedimos logo minutos.Nenhum outro povo pedirá 5 minutos com a clara noção de que, meia hora volvida, ainda estaremos no mesmo ponto, na mesma situação.

Isto dos 5 minutos é um engodo maldito para, normalmente, esquecer factos ou enganar o próximo.

Vejam bem: quando digo aos meus amigos (eles podem confirmar - sintam-se à vontade para falar mal de mim) que estarei a chegar em 5 minutinhos, eles sabem que é um claro sinal de que ainda nem acabei de me aprontar, e que me farei tardar. Se dissermos a alguém que fazemos/iremos/perguntamos/etc algo em 5 minutos, estamos a dizer que não queremos saber de nada do que nos foi proposto, e que, com a palma da mão a bater na nossa testa, descaradamente, nos desculparemos porque nos “esquecemos totalmente”. Quando, na rua ou à porta de casa, nos dizem “Tem 5 minutinhos?”, sabemos que nunca durará menos de uma hora.

5 minutinhos são então pílulas amnésicas, ou ampulhetas mágicas em que a areia no seu interior cai grão a grão, com prazo indefinido.

Ninguém me roubará 5 minutinhos indiscriminadamente, sem a minha permissão. Quando mos pedirem, irei olhar para os arames aguçados do relógio. E contarei, segundo a segundo, os 5 minutinhos que cedi.

Não sei se estarei certa ou errada. Mas, peço 5 minutinhos para pensar sobre isso.


Más línguas, boas conversa
In Jornal Terra Quente

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